rapa de angu é um bom tira gosto - foto da Leticia Caetano

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Continuação:" Histórias em Kergoat", publicada no blog no dia 29 de Agosto


Romulo Marques Ribeiro é de Belo Horizonte,toca baixo acústico e mora há 20 anos em Paris
"Do lado de lá"

Salvando os pássaros

Na volta para Kergoat, percebi que o tempo havia piorado subitamente: o céu ficou escuro deixando passar por ele somente algumas rápidas nuvens cinzas, isolando aquela terra, distante do sol esquecido. A tarde havia desaparecido deixando a noite precoce reinar sobre o mundo. Dos pássaros já não se ouvia mais nada: recolheram-se em massa para o sono profundo.
Fui andando pela estrada, à medida que o tempo piorava. A chuva veio forte, mas o mais impressionante era o vento que a acompanhava: era tão violento, que eu mal conseguia andar. Comecei a ficar com medo. Não era medo do vento me levar, ou de ficar completamente molhado, mas o de que os postes caíssem sobre a estrada, já inundada pelo temporal. Apressei os passos e consegui chegar ensopado até a alma. Mas vivo. O que acabara de ver não era uma chuvinha simples de verão, ou uma chuva forte de mudança de estação, mas um dos maiores temporais da historia da França. O vento soprava a mais de 170 km/h e eu ficava, juntamente com os meus amigos, fechado na casa, pasmo com aquele poder absoluto e misterioso da natureza. Era como se dois deuses brincassem de ciclones. E os ciclones eram dois: o Lothar e o Martin. As árvores, como os velhos pinheiros que marcavam o vale visto pelas janelas, cediam tão facilmente aos eufóricos sopros, que pareciam minúsculas maquetes feitas com pauzinhos e papeis coloridos. E a brincadeira dos deuses soprando durou muito tempo.
No dia seguinte o resultado da tempestade foi trágico. A quantidade de animais mortos, sobretudo de pássaros, era impressionante. Tanto quanto à quantidade de carros e casas, de cidades e estradas completamente destruídas. Lamentável e inesquecível. Para evitar a morte de tantos pássaros nas próximas tempestades, uma equipe da "Art Grandeur Nature" inventou uma maquina equipada com uma hélice pesada, que, agitada por ventos fortes, ativa 27 apitos que imitam os cantos dos principais pássaros que freqüentam a região parisiense, mantendo-os acordados e com uma maior possibilidade de sobrevivência.
Para onde eles vão voar... Disso ainda não sabemos, nem vimos o resultado. A “maquina" foi instalada no parque Buttes-Chaumont durante o verão, ou seja, no mês de agosto. Mas esperamos que os deuses sejam mais amenos para que nossos pássaros possam dormir tranquilos.

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